Ouvir vinil - uma experiência para lá do som

Muitos dos que sabem da minha preferência por discos de vinil me perguntam porquê e qual a diferença entre ouvir um vinil e ouvir um CD. Normalmente respondo que a diferença começa no som, mais puro no vinil, onde é possível distinguir e isolar o som de cada um dos instrumentos e onde a voz tem o lugar de destaque que deve ter. Um vinil tem um som muito mais próximo do "ao vivo" que o CD.

Mas a verdade é que ouvir vinil é uma experiência sensorial que começa muito antes do acto de ouvir música... Começa na procura e compra dos discos, no remexer nas caixas, nas feiras de usados, onde se encontram relíquias, no "sentir o peso" do disco (se for de 180 gr é um prazer senti-lo), no procurar edições especiais, limitadas, únicas, raras, coloridas, impressas... é o tacto a funcionar, remexer, revirar, percorrer com os dedos centenas de discos em busca daquele único que nos arrebatará o coração.
A visão fica deslumbrada com as capas, algumas delas verdadeiras obras de arte. Admira-se o grafismo da capa, da contra-capa... e ainda há aqueles que têm mais uma capa interior, que para além de proteger o vinil, traz normalmente as letras das canções e algumas fotos. Tudo isto, sem pressas, numa doce e calma sedução visual e táctil...
Depois vem o cheiro. Já repararam bem no cheiro de um vinil a sair da capa? É delicioso! É como folhear um livro novo...
E, finalmente, temos o ouvir... ouvir um vinil envolve todo um ritual de prazer, repetido a cada disco, saboreado a cada gesto: escolher o disco, retirá-lo da prateleira, admirar a capa e a contra-capa... Retira-se o disco da capa e pega-se nele como se se acariciasse um amante. Limpa-se, coloca-se no prato, sobe-se e posiciona-se o braço, coloca-se a agulha no disco e ouve-se aquele ruído que nos provoca um arrepio... e entregamo-nos a todo um momento de prazer único, durante a sua audição.

Os discos e os "gira-discos" não são portáteis, precisam de espaço, porque ouvir vinil não é o mesmo que estar a ouvir música enquanto conduzes ou trabalhas naquele relatório desinteressante e monótono, que tem o prazo de entrega a terminar. Ouvir música em vinil é todo um ambiente, é um acto de amor. Ouvir vinil não é gostar de música, é ser apaixonado por música, é escutar música em todos os seus instrumentos, nuances, tons, é sentir a música. Ouvir vinil é uma experiência sensorial que te envolve de prazer e faz o mundo parar... é sentir arrepios enquanto a agulha percorre suavemente a superfície de onde saem os sons da nossa vida. E entregares-te a todo esse prazer, suavemente, de olhos fechados, sem pressas...
Rosa Soares (Rocky Rose)