“Musonautas – Visões e Avarias: 1960 – 2010: 5 Décadas de Inquietação Musical no Porto”

11-10-2018

Armindo Pereira da Costa, conhecido como Armindo "Rock", tinha 17 anos em 1963, e fazia estremecer o Porto, com o seu ar rebelde e irreverente, a fazer lembrar Elvis Presley. Auto denominava-se "rei do rock and roll e do twist português", o que causou algum mal-estar no meio musical da época. Mas não era só o meio musical que o Armindo "Rock" agitava... as invasões de palco nos festivais de música em que participava levaram à intervenção policial, pois tal comportamento era oponente dos bons costumes ditatoriais, assim como o seu blusão de cabedal preto chocava com as discretas e clássicas indumentárias que os artistas desses tempos apresentavam em palco. Com os festivais de "rock e twist" e os próprios concertos de Armindo proibidos na cidade Invicta, este decide mudar de visual e de estilo musical.

É com estes acontecimentos que começa a exposição "Musonautas - Visões e Avarias: 1960 - 2010: 5 Décadas de Inquietação Musical no Porto" onde, através de vários documentos, viajamos por uma paleta de sonoridades que fazem parte da história da música, não só da cidade do Porto, mas de Portugal.

Cartazes, discos, notas pessoais dos músicos, peças de roupa, fotos, fanzines, revistas, e muitos outros, fazem a delícia dos melómanos, coleccionadores e apaixonados por memorabilia (como eu!) que visitam esta exposição. Muito bem conseguida visualmente, os objectos que a compõem estão organizados por décadas, ao longo das paredes da sala. Na zona central, encontram-se "ilhas" dedicadas a bandas ou compositores musicais das mais variadas vertentes.

Notícia na imprensa da década de 60, sobre o "Discípulo do Demónio", nome artístico do vocalista Alberto da Silva Freitas Lima. 


Em Janeiro de 1969,os "Jotta Herre" eram notícia. O motivo? A gorjeta de 20.000 libras que receberam de Paul McCartney, depois de os ouvir no Penina Golf Hotel

Musonautas era o nome do programa da Rádio Comercial (que mais tarde deu origem ao livro homónimo), de Jorge Lima Barreto, musicólogo, com fortes ligações aos sons mais experimentais, e a quem é dedicada uma das "ilhas" temáticas, onde podemos ver o referido livro "Musonautas".

Os GNR ocupam a ilha que destaca os anos 80 e cujo tema "Avarias", do álbum "Independança" (1982) foi, também, emprestado ao título da exposição. Neste espaço para além de um dos casacos usados por Rui Reininho, estão vários recortes de imprensa e o CD duplo "Tudo o que você queria ouvir - O Melhor dos GNR", colectânea que atingiu as vendas de 40 mil unidades, com a primeira edição e as 80 mil cópias vendidas (na segunda edição), sendo por isso duplo platina.

Estão também presentes Filipe Pires, Álvaro Salazar e Cândido Lima, compositores de música erudita e contemporânea.

Sérgio Godinho e José Mário Branco, têm cada um, o seu espaço, enquanto representantes da música de intervenção e crítica político-social,

Chegamos aos anos 90 e encontramos Manel Cruz, fundador dos Ornatos Violeta, com uma ilha que ele próprio construiu, e que é bem o espelho da identidade do músico e da banda. Ainda nessa década, encontramos um espaço dedicado ao hip-hop, com os Mind Da Gap em sua representação.

A década de 2000 - 2010 deixou-me com um sabor "a pouco": são abordados neste período, artistas como Ghuna X ou Mécanosphere e Motornoise, faltando referências a Clã ou X-Wife, por exemplo.

Alusivo a esta década está o destaque ao Festival Matanças, festival onde arte sonora e visual se misturavam com ritualismo e ocultismo. Celebrava-se no fim-de-semana antes do Natal, na Casa Viva, espaço autogerido na Praça do Marquês, bem no centro do Porto. Uma das características deste festival era o humor sarcástico e o improviso - a maioria das "bandas" que actuavam eram criadas propositadamente para o festival, e tinham a duração do fim-de-semana.

No final, a parede de vinis e cd's leva-nos numa viagem visual e de memórias, pelas artworks mais ou menos elaboradas, pelas editoras de outros tempos e por bandas e artistas tão diversificados como Blusões Negros, Três Tristes Tigres, Sérgio Godinho, Roxigénio ou Foge, Foge Bandido.

No entanto, e porque se trata de uma viagem pela inquietação musical no Porto, senti a ausência do destaque a bandas de sonoridades mais pesadas, tais como Tarantula (1985), Head: Stoned (2006), Dove (1988 - 1995) ou W.C. Noise (1990 - 1996) - as duas últimas reconhecidas como pioneiras no thrash-metal português -, entre outras, que marcaram o underground portuense e nacional, meio imensamente rico em qualidade e profissionalismo. Estão expostos alguns discos, como o vinil "Loud n' Mad" dos W.C. Noise, e os cd's "Tarantula III" dos Tarantula e "Infected Ideologies" dos Gangrena, mas considero que este género musical, pela sua forte presença ainda na actualidade, deveria ter um espaço mais detalhado (uma "ilha" por exemplo).

Apesar deste meu apontamento, muito pessoal e obviamente que marcado pelos meus gostos musicais, gostei bastante da exposição e recomendo sem reservas. Uma excelente iniciativa, e uma forma bastante dinâmica e visual de mostrar 50 anos da música no Porto e em Portugal. 

Rosa Soares

De seguida poderão ver mais algumas fotos da exposição (fotos tiradas com telemóvel e sem flash, tal como é permitido pela exposição. 

Algumas fotos da exposição

Cartazes e as luvas de boxe usadas por Ana Deus, dos Três Tristes Tigres, no videoclipe de O Mundo A Meus Pés (1993). 


Notícias dos Arte & Ofício

Nota manuscrita de Pedro Abrunhosa, para Adelino Tavares. Assunto: Press Release e divulgação de concertos 

Disco de Ouro dos TAXI - 30.000 cópias vendidas em 1981 (Editora Polygram)

Revistas "Mundo da Canção"

"Ilha" dedicada ao Festival Matanças

"Ilha" de Jorge Lima Barreto

Exposição de vinis. 

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